quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

O urbicídio e suas características em Gaza

 Prof. Dr. Márcio José Mendonça 

O urbicídio como política de guerra contra o espaço urbano também pode ser definido como uma medida de guerra contra o terrorismo, (incluindo o terror de Estado em projetos coloniais), isto é, de antiterrorismo, conforme descrito nos trabalhos de Stephen Graham e Derek Gregory. Esta tese baseia-se principalmente na inseparabilidade da guerra, do terror, da aniquilação de lugares e do urbanismo moderno, na perspectiva de um processo de colonização, em que as cidades são percebidas, no imaginário geopolítico da elite política, como lugares “caóticos” e “perigosos”, que precisam ser controlados e disciplinados, seja pela guerra ou através de políticas de planejamento urbano nas cidades colonizadas. Assim, o urbicídio é um produto ou elemento de conflitos armados, guerras, ataques preventivos e campanhas antiterroristas. 

Em todos os casos, o urbicídio envolve a utilização de guerra, planejamento urbano militarizado e discursos de “antiterrorismo” para atingir grupos rebeldes que lutam no espaço urbano, contra colonialismo moderno. Por conta disso, o urbicídio pode ser compreendido como uma ação de coordenação de estratégias militares para destruir condições de resistência e independência. A atual campanha militar israelita na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, na Palestina Ocupada como um tudo, é um exemplo de como Israel usa da justificativa de combate ao “terrorismo palestino” para atacar o espaço urbano e promover a limpeza étnica na região.

Graham, um dos especialistas no assunto, argumenta que existem muitas estratégias israelenses que constituem urbicídio. Isto ocorre por meio da demolição de casas e espaços urbanos, na destruição intensiva de infraestruturas e no enfraquecimento sistemático da urbanização e da modernização da sociedade palestiniana pela construção de assentamentos judaicos, estradas secundárias e o Muro de Separação. Estas estratégias são aplicadas para fragmentar e minar a contiguidade e a coerência do território palestino e construir, em vez disso, um ambiente que maximize a capacidade das forças de ocupação para inspecionar, cercar e controlar as terras e populações ocupadas. Dessa maneira, podemos entender o urbicídio como uma estratégia de controle, com muitos impactos destrutivos na estrutura física do meio ambiente urbano. Ainda assim, é preciso distinguir algumas características gerais desse discurso, aplicadas na Palestina ou em outros locais, onde observamos a destruição sistemática do espaço urbano em conflitos armados.

 Para isso, Nurhan Adujidi lista cinco características do urbicídio que devem ser levados em consideração na análise de programas de índole urbicida:

1 O cenário é sempre um ambiente urbano (construído) e habitado;

2 Há sempre danos e destruição generalizada ou total infligida a esse ambiente;

3 O local de destruição é demonizado ou desumanizado – antes de ser destruído;

4 A destruição é exercida para alcançar a reconfiguração e o controle espacial;

5 A destruição é sempre premeditada, intencional e planejada.


Faixa de Gaza

Fonte: Carta Capital

Para mais detalhes sobre o debate do urbicídio e uma revisão teórica mais ampla, consulte "Espaço de batalha e urbicídio na cidade do Rio de Janeiro" (Mendonça, 2022). Acesse: https://www.amazon.com.br/s?k=Espa%C3%A7o+de+batalha+e+urbic%C3%ADdio

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